Com o centro tomado por
barricadas, lojas fechadas e ruas desertas, a capital paraguaia,
Assunção, assistiu na sexta-feira à queda de Fernando Lugo e a ascensão
ao poder de Federico Franco - em um processo 'relâmpago' de impeachment
visto com grande apreensão pela comunidade internacional.
Ao menos 5 mil partidários do presidente deposto se reuniram em frente ao Parlamento e entraram em confronto com forças policiais assim que o Senado anunciou o afastamento de Lugo do poder.
Mais de 4 mil policiais tentaram
dispersar a multidão usando gás lacrimogênio e munição não letal. A ação
levou confusão e desespero à multidão de manifestantes, que acabou se
dispersando. Muitos voltaram depois, dessa vez para protestar
pacificamente.
Fonte: BBC Brasil, 22/06/12, disponível em: http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/06/120622_paraguai_clima_jf.shtml
“Derrubaram Lugo”, afirmou uma mulher de meia
idade no aeroporto de Assunção. As reações dos demais variaram entre
olhares graves, palavras de reprovação mas também indiferença.
Passageiros ouviam o desfecho do julgamento por
meio de rádios ainda dentro do avião que chegava do Brasil. No
desembarque, taxistas avisavam que o centro da cidade - onde fica o
Congresso - havia sido interditado pela polícia após ser tomado pelos
manifestantes
“Houve um golpe, é muito perigoso ir para lá
agora”, explicou um motorista, que concordou em deixar um grupo de
jornalistas – entre os quais a reportagem da BBC Brasil – em um ponto a
dez quadras do centro.
Bloqueios
No caminho, as ruas vazias e o comércio fechado
davam a impressão de uma tarde de domingo. À medida que o carro se
aproximava da praça do Congresso, porém, barricadas e cercas vigiadas
por policiais mostravam que não se tratava de um dia comum.
As barricadas haviam sido montadas com barris de metal enfileirados. Policiais usavam varas de metal para improvisar cancelas.
No trajeto de dez quadras a pé em direção ao
centro, a BBC Brasil cruzou com cerca de 15 manifestantes solitários ou
em pequenos grupos, que aparentavam cansaço e desalento. Diziam que o
grosso da multidão já havia se dispersado e que retornariam às ruas no
dia seguinte.
Mais numerosos eram jornalistas, arrastando
malas e equipamentos de TV para seus hotéis, e principalmente policiais
agrupados nas esquinas.
Num ponto de táxi nos arredores do Congresso, três taxistas assistiam à transmissão dos eventos na TV.
“Temos que esperar pelas reações: muita gente
ainda não sabe o que está acontecendo, tudo foi muito rápido”, diz o
taxista Ariel Ortega. “Nós, paraguaios, somos tranqüilos, mas há
limites”.
Reação internacional
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, afirmou
que não reconhece o novo governo do Paraguai. Ele disse que a
destituição de Lugo foi um golpe contra a população paraguaia, a Unasul
(União de Nações Sul-Americanas) e que o atual governo é ilegítimo.
Os governo da Argentina, do Equador, da
República Dominicana e da Bolívia também classificaram a destituição de
Lugo como um "golpe de Estado", segundo a agência de notícias Efe.
O secretário-geral da Unasul Ali Rodrigues
Araque afirmou à BBC Brasil que a comunidade sul-americana está diante
de "uma situação de fato, de um golpe de Estado".
A Unasul avalia que não foi respeitado o devido
processo legal para que Lugo pudesse se defender das acusações e que a
democracia no país está ameaçada.
O presidente Chávez indicou ainda que poderá
haver sanções contra o novo governo paraguaio por parte dos países da
Unasul. "Isso não termina aí", afirmou.
O Brasil liderou uma missão de chanceleres
sul-americanos enviada ao Paraguai ainda na quinta-feira. A viagem se
baseou em um protocolo da Unasul que dá aos seus membros a possibilidade
de impor sanções a um país em caso "de ruptura ou ameaça de ruptura da
ordem democrática".
Um dos artigos do documento prevê como sanção o
fechamento das fronteiras com o Paraguai. Até a madrugada de sábado, o
Itamaraty não havia emitido posição oficial do Brasil sobre o
impeachment de Lugo.
Processo relâmpago
A Câmara dos Deputados paraguaia aprovou na
quinta-feira a abertura do processo de impeachment contra Lugo como
reflexo de um conflito agrário que deixou 18 mortos - entre policiais e
sem-terra - durante a reintegração de posse da fazenda de um empresário
ocorrida há uma semana.
Horas depois da aprovação, deputados
apresentaram no Senado cinco principais acusações contra o então
presidente. A maioria delas se relacionava a ligações de Lugo com
movimentos "carperos" (sem-terra), ao suposto emprego irregular de
militares em ações políticas ou relacionadas à questão da terra, e ao
resultado desastroso da reintegração de posse da semana anterior.
Lugo e sua equipe tiveram então 18 horas para
preparar uma defesa e mais duas horas para apresentá-la aos senadores na
tarde de sexta-feira. No início da noite, um Senado dominado por ampla
maioria oposicionista considerou Lugo culpado das acusações por 39 votos
a quatro.
Já destituído do cargo - pouco mais de um dia
após o início do processo de impeachment - Lugo fez um discurso de
despedida no qual acatou a
decisão do Congresso, embora a considerasse
"covarde".
"Hoje não é Fernando Lugo que recebe um golpe,
hoje não é Fernando Lugo quem é destituído, é a história do Paraguai e
sua democracia", afirmou.
Minutos depois, seu ex-vice, Federico Franco, do
PLRA (Partido Liberal Radical Autentico) recebeu a faixa presidencial
prometendo respeito às instituições democráticas do país e garantindo
que entregará o cargo ao próximo presidente, que deve ser eleito em
2013.
Lugo e Franco haviam chegado ao poder em 2008
formando uma aliança que quebrou uma hegemonia de seis décadas do
Partido Colorado na Presidência. Mas, a aliança acabou sendo desfeita ao
longo do mandato. O apoio do PLRA, que tem a segunda maior bancada no
Senado, teve grande influência na aprovação do impeachment.
"O destino quis que eu assumisse a Presidência da República", disse Franco em sua posse.
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